Pego minha bicicleta. Ponho o fone no ouvido. Topo o volume ao máximo e começo a pedalar. E durante esses breves momentos uma sensação incrível toma conta de mim. Uma sensação de liberdade. Como se eu tivesse sido automaticamente transportada para um mundo só meu, um universo paralelo, um mundinho inatingível. E do nada sinto uma gota de água cair no meu rosto e escorrer pela minha face até que ela cai no asfalto e se perde. E dentro de poucos segundos várias outras gotas começam a acompanhar aquela primeira, como se não quisessem deixá-la sozinha e perdida. E essa água escorre sobre mim me lavando, purificando seria uma palavra mais adequada. É como se alguém estivesse chorando por mim. Se compadecendo do meu sofrimento. Esse sentimento horrível de vazio que me acompanha e que nada nem ninguém foi capaz de preencher. Um vazio que se tornou uma sombra indesejável. Parece algo triste de se dizer.
Me pego pensando em tudo. Milhões de coisas passando pela minha cabeça ao mesmo tempo. Sou inundada por um turbilhão de pensamentos e emoções que me invadem e aumentam essa confusão que parece me acompanhar constantemente. Eu penso em tanta coisa que por fim não consigo pensar em nada. É pensar no tudo e no nada ao mesmo tempo. Penso nos arrependimentos deixados no meio do caminho. Largados a mercê da minha consciência que me remete a culpa.
Sinto aquele cheiro de terra molhada. Aquele cheiro inebriante que geralmente acompanha essas gotinhas de água. Um cheiro que faz com que eu sinta essa imensidão ao meu redor. Um cheiro reconfortante. Algo que me faz pensar num lar. Como se alguém me dissesse “Não se preocupe, eu estou aqui com você.” Mas não tem ninguém lá. É apenas o habitual vazio ao qual já me acostumei. E por mais esforço realizado nada muda. Tudo está onde é suposto que esteja e o problema está aí. Porque o suposto a se fazer realmente é o certo a se fazer? E se for o certo, é o certo pra mim ou pra você?
Passo pelas pessoas enquanto pedalo e todas parecem estar indo a algum lugar. Algumas com pressa, quase uma ansiedade. Outras nem tanto, apenas caminhando e aproveitando o que a vida tem a oferecer. Mas mesmo assim indo a algum lugar. Todos parecem ter um objetivo no final do túnel, um foco no final da rua, mesmo que o poste esteja apagado e esse objetivo esteja obscuro. Bem, todos menos eu. Porque tem que ser tão difícil?
Quanto mais olho para o final do meu túnel, menos eu consigo visualizar as respostas. Não consigo encontrar o objetivo ou o porquê te tudo isso. É como se eu estivesse trilhando um caminho longo e cansativo para algum lugar o qual eu não sei onde é, não sei como chegar lá e nem sei o que ou quem vou encontrar lá. Mas eu continuo andando. Continuo seguindo em frente em direção a essa Utopia.
Quando a derradeira gota está a escorrer pela minha bochecha e estou freando a bicicleta, lembro das muitas pessoas que já passaram por mim, lembro muito bem delas. Elas ficaram pra trás, por mais que eu quisesse que elas tivessem prosseguido. Talvez por falta de paciência em ver onde esse túnel ia dar. Talvez não, não sei. Eu queria poder dizer que não estou trilhando sozinha. Dizer que quando olho pro lado encontro um sorriso acolhedor, mas não posso dizer isso porque não sinto isso. O planeta tem bilhões de pessoas e eu não consigo olhar apenas uma delas e sentir algo, qualquer coisa que me faça sentir que não estou sozinha. Talvez seja apenas impressão minha ou minha loucura já me fez estar em estado terminal. Enfim, são apenas devaneios. Devaneios de uma pessoa sem rumo...